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| | Em memória de Manuel Lopes Por José Macedo Vieira *
Na véspera da grande festa dos pescadores poveiros à Senhora da Assunção, sua padroeira, faleceu Manuel José Ferreira Lopes, que é necessário evocar, e perpetuar, como um dos maiores Poveiros de sempre.
Homem culto, cultíssimo, dominava enciclopedicamente áreas diversíssimas do saber, que convergiam na sua sustentada e muito própria visão do mundo e da vida.
Poveiro até à medula, nada do que à Póvoa de Varzim dizia respeito lhe era indiferente – ao contrário, tudo o apaixonava, desde o passado histórico, a cuja descoberta e divulgação se devotou apaixonadamente, e que erigiu em base dinâmica de um presente de onde se visse, claramente, um futuro melhor.
Homem de causas, a que se deu ilimitadamente – e foram tantas! – a algumas deixou indelevelmente ligada a sua vida: a Biblioteca – talvez a sua maior paixão, o sítio onde era feliz e onde partilhava felicidade na forma de um saber que a todos se dava e a tantos iluminava nos caminhos da formação cultural e da realização profissional, o espaço aberto e atraente que converteu num centro de irradiação e de dinamização cultural; o Museu, onde o conceito dinâmico de património inspirou e continua a inspirar (porque aqui Manuel Lopes fez escola) exposições temáticas que tornam o passado tão próximo de nós, explicando o povo singular que somos; a Lancha Poveira do Alto, cuja recuperação e divulgação erigiu em símbolo da própria Comunidade; o Boletim Cultural, que coordenou ao longo de décadas, como colaborador próximo e indispensável de directores tão distintos como Flávio Gonçalves e Manuel Amorim, e de cuja projecção, junto dos grandes centros universitários e académicos, foi promotor; e tantas, tantas outras missões…sim, que nele tudo tinha essa motivação profunda, e essa era a razão por que se dava ilimitadamente às causas em que se envolvia.
De uma modéstia e despojamento quase monásticos, sempre Manuel Lopes fugiu à notoriedade a que naturalmente o guindaria a sua ímpar dimensão cultural. Fisicamente refugiado na Biblioteca Municipal, que continuou a dirigir mesmo após a merecida reforma, sempre Manuel Lopes viu nesta Casa da Cultura a sua habitação, de que a morada particular, na Avenida Mousinho, não era mais que uma extensão – e tanto que, numa disposição testamentária que só confirma a coerência e a fidelidade aos princípios por que sempre norteou a sua vida, entregou esse seu património, por doação, à guarda do município, para fins de investigação e apoio à criação cultural.
A Manuel Lopes outorgou o município, no Dia da Cidade, em 1994, a sua Medalha de Reconhecimento - distinção que, ferindo profundamente a modéstia do homenageado, o fez, então, retratar-se em Álvaro de Campos: “olho-me apavorado a enrolar os pés, publicamente, nos tapetes das etiquetas”.
Era assim, de facto, Manuel Lopes, naquele reservado feitio muito seu, de quase desprezo pelas distinções e pelas honrarias.
Foi aquela, então, a homenagem possível. Porque a outra – que, tenha a dimensão que tiver, ficará sempre aquém do mérito da sua obra, ainda não plenamente conhecida – será sobretudo aquela que, colectivamente, formos capazes de concretizar, dando continuidade ao trabalho e aos projectos de Manuel Lopes. Como se ele continuasse fisicamente entre nós.
O que até aqui deixo escrito foi por mim proposto à Câmara Municipal a que presido, em sessão de 21 de Agosto, e pela Vereação unanimemente aprovado como “Memória” do Cidadão, do Intelectual e do Funcionário que, nos vários campos de uma vida cheia, enobreceu e prestigiou a Póvoa de Varzim, a Cultura e o Município. (…)
* Presidente da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim
In: VIEIRA, José Macedo - Em Memória de Manuel Lopes. Póvoa de Varzim Boletim Cultural. Póvoa de Varzim: Câmara Municipal, Vol. 40, (2005-2006), p. 7-8. |